quinta-feira, fevereiro 16, 2006

Condutor em Fuga, PARTE I

Sentiu necessidade de se ausentar. Quase desde o primeiro momento. Ficar longe podia ter um duplo efeito. Obrigar-se a não travar conhecimento com o que se passava na sua ausência e obrigar-se a sentir-se... ou deixar de se sentir. Por momentos ficou confusa. Percebeu que a sua ânsia era essa, deixar de se sentir. Procurar abrir o peito para deixar entrar qualquer outra coisa que não aquela imensa angústia que lhe tinha assaltado o peito de há uns meses para cá. Percebeu que teria de deixar aliviar essa tensão, a de estar constantemente a ser posta à prova. Primeiro porque não podia pressioná-lo, depois porque não devia, por último porque já não queria. Por outro lado porque tinha de ser forte, porque tinha de reagir, não deixar de ser mãe, não deixar de ser pessoa, não deixar de ser mulher. Tudo eram exigências, tudo pareciam formas de pressão. Tanto que se sentia culpada cada vez que pisava o risco, cada vez que se dava ao manifesto e se expunha à rejeição e ao sofrimento.
Esta viagem, a fuga que queria fazer dentro de si, sabia que só iria adiar qualquer coisa. Mas dava-lhe algum tempo, pelo menos para não ter só que reagir às coisas. Talvez conseguisse fazer planos, talvez conseguisse perceber que ela ainda lá está, dentro de si, perdida, mas pronta para se achar. E que os dias devem ser consumidos, um após o outro, sem esta aflição que o tempo passe depressa e que ajude a curar aquilo que lhe doi.

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